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Foto de la ilustración de fondo © Rolando Prats (2016)

"Cajón em São Paulo": uma experiência habanera* Idalia Morejón Arnaiz e Tatiana Lima Feria

Em junho de 2016, a Malha Fina Cartonera convidou o poeta cubano Omar Pérez para um conjunto de atividades em São Paulo ― palestras, oficinas, entrevistas e um recital de poesia e performance que aconteceu na terceira edição de La Garçonnìere, no Estúdio Lâmina. Na ocasião, o poeta interpretou, acompanhado do cajón, os poemas que farão parte de Cubanologia, antologia que publicaremos neste ano, acompanhada das vídeo-performances realizados pelo cineasta João Krefer a partir da apresentação de Omar. O intuito de convidá-lo para realizar esses vídeos era o de problematizar como a performance, que se pretende efêmera, pode ocupar outros lugares e interagir com outras linguagens (música, cinema e artes visuais).

 

Com isso, o vídeo não é apenas o registro de uma performance de poesia, mas é também uma vídeo-performance. Krefer realiza uma outra abordagem dos poemas, isso pode ser visto na diferença entre a atmosfera da apresentação original (sala lotada e público entusiasmado), e dos vídeos editados. Dessa forma, Krefer acabou construindo uma nova plataforma para o trabalho poético e musical do cubano, em que marca também a sua leitura e originalidade como cineasta ao pensar nos jogos de claro e escuro, observados no vídeo, nas distintas dimensões do corpo e suas multiplicações, especialmente as mãos tocando o cajón, sem que o poeta deixe de estar no centro.

 

Com o resultado dessa experiência, chegamos a Habana no mês de janeiro para mostrar os vídeos ao poeta e também com a expectativa de exibi-los publicamente, o que aconteceu no dia 20 de janeiro no estúdio de tatuagem e galeria La Marca. Localizado no centro histórico de Habana, La Marca reúne alguns dos paradoxos da vida cubana: a proibição da comercialização da tatuagem e a concepção da tatuagem como uma arte do corpo, uma vez que o que legitima que tal estúdio funcione em Habana é o fato de ele ser, também, uma galeria de arte. Neste sentido, o espaço dialoga com a vídeo-performance de Omar, pois da mesma forma como os artistas de La Marca pensam o corpo como um suporte para a arte, nós também buscamos com este trabalho encontrar outras plataformas para a poesia, unindo-a à musica, ao cinema e às artes visuais.

 

O público de Habana, acostumado com as performances ao vivo de Omar se surpreendeu com o vídeo que apresentava a poesia e a música sem desconstruir a autenticidade de sua voz poética e sua expressão corporal.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A interação com o poeta em sua cidade nos fez ter dimensão da sua rotina, totalmente dedicada ao trabalho artístico, que perpassa não somente pela música e poesia, mas também pelas artes visuais, uma vez que o poeta converteu as paredes da sua casa em suporte para suas intervenções visuais, aproveitando-se dos escombros produzidos pelo tempo e pelo salitre, já que mora em frente ao Malecón. Dentre os desenhos nas paredes de Omar, vemos como alguns temas vistos em sua poesia se repetem: a austeridade, o feminino e o masculino, a casa como um corpo vivo e reflexo do que é o homem, o budismo e a crítica social. A casa é tratada por Omar como um corpo doente que é preciso curar, aliviando as paredes e o solo de qualquer peso desnecessário, transformando as crostas de cimento em intervenção plástica e amorosa e o entulho (as crostas desprendidas) em material artístico

En casa de Omar Pérez en La Habana (fotografía © Rolando Prats)

Este pequeno relato não se esgota agora, pois em junho deste ano lançaremos Cubanologia, contendo os poemas da performance traduzidos ao português e alguns outros inéditos. Assim como a exibição das vídeo-performances de Omar em Habana nos propiciaram uma nova perspectiva para o seu trabalho, cremos que nesse lançamento também veremos como sua poesia, música e arte se ressignificam através de sua interação com o público e seus leitores, demonstrando que a poesia permanece viva.

*Publicado en Malha Fina Cartonera (https://malhafinacartonera.wordpress.com) el 29 de marzo de 2017. Reproducido con autorización de Idalia Morejón Arnaiz.

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